Clube de Leitura: magistrados discutem a obra “Dias de Abandono”, da italiana Elena Ferrante

Submerso em sentimentos de perda e reconstrução, romance retrata o impacto de uma separação inesperada na vida da protagonista
O Clube de Leitura da AMB realizou mais um encontro dedicado à reflexão sobre obras que exploram a complexidade da natureza humana. Desta vez, o livro debatido foi “Dias de Abandono”, da escritora italiana Elena Ferrante.
O encontro contou com ampla participação de magistrados de diversas regiões do país, muitos já familiarizados com a obra da autora, reconhecida mundialmente pela aclamada "Tetralogia Napolitana" e por "A Filha Perdida", adaptada para o cinema em um filme premiado.
A discussão foi conduzida pela professora e crítica literária Juliana Bergamo, especialista na produção de Ferrante, que compartilhou sua trajetória de pesquisa e destacou a capacidade da literatura de criar conexões humanas.
“Sempre penso que a literatura é uma partilha de algo sensível. Mesmo sem nos conhecermos, conhecemos a autora, sua obra, e nos encantamos pela história. Então, de alguma forma, algo em nós se reconhece”, afirmou.
Um dos aspectos mais intrigantes sobre Ferrante é o fato de usar um pseudônimo — uma escolha que evita a exposição pessoal e, ao mesmo tempo, alimenta o mistério em torno de sua identidade.
Seu primeiro romance, "Um amor incômodo", foi publicado em 1992. Dez anos depois, lançou "Dias de Abandono", seu segundo livro, que se passa em Nápoles e acompanha o colapso emocional de Olga, uma mulher que, após ser deixada abruptamente pelo marido, enfrenta uma profunda crise existencial. Com uma linguagem direta e intensa, Ferrante leva o leitor a mergulhar na psique de sua protagonista, revelando a fragilidade e a força que coexistem no feminino.
“Essa personagem, já nas primeiras linhas, nos diz: algo ruiu, e vou ter que lidar com isso. Um dos elementos mais potentes do romance é a casa se desfazendo junto com ela”, observou a professora.
Juliana Bergamo também ressaltou que, diante da ruptura, a protagonista é forçada a revisar sua própria vida — um tema recorrente na obra de Ferrante.
O Desembargador Franco Cocuzza (TJSP) destacou o impacto emocional da narrativa.
“É um texto muito intenso, especialmente naquelas 20 páginas que mostram a desorientação dela. Fiquei pensando: é impossível alguém escrever isso sem ter sentido essa dor na pele”, disse.
Segundo a professora, em entrevistas, Ferrante nunca confirmou se viveu uma separação semelhante, o que alimenta a curiosidade do público.
“Esse é o grande questionamento: será que ela está falando a verdade? Viveu esse divórcio ou não? Isso pouco importa, porque a verdade está dentro do romance. É uma história tão bem escrita, articulada e construída, que ali reside a verdade — a verdade da ficção”, afirmou.
O encontro foi mediado pela Juíza Daniela Almeida Prado Ninno (TJSP), que destacou a forma como a maternidade é abordada no romance: “Me chamou atenção como a maternidade é tratada de maneira intensa sob diversos ângulos — desde a relação da protagonista com sua mãe, até as diferenças entre sua relação com a filha e com o filho”.
Assista ao encontro do Clube de Leitura no YouTube:
Próxima obra
A última leitura do primeiro semestre do Clube de Leitura da AMB será "O Poder e a Glória" , de Graham Greene.
Publicado em 1940, o romance é ambientado no México da primeira metade do século XX, durante a Guerra Cristera. A trama acompanha a perseguição implacável a um padre fugitivo por parte de um tenente que, sob ordens do governador da província, o caça de maneira quase fanática.
O encontro será mediado pelo Desembargador Franco Cocuzza (TJSP).
SERVIÇO
Clube de Leitura - “O Poder e a Glória”, de Graham Greene.
Quando: 25/06
Horário: 19 horas
Inscrições: [email protected]
Formato: on-line via plataforma Zoom